Em meio a constantes denúncias de descaso e negligência no Hospital Geral de Parauapebas (HGP), a Prefeitura Municipal decidiu ampliar o modelo de gestão terceirizada da saúde. O Diário Oficial nº 1069 publicou o Edital 001/2025, que prevê a qualificação de Organizações Sociais (OS) para administrar serviços públicos de saúde em todo o município.
A iniciativa, que repete a fórmula já aplicada no HGP, levanta questionamentos graves sobre a efetividade do modelo, o risco de transferência de responsabilidades públicas para entidades privadas e a real motivação por trás do projeto.
O edital tem como objetivo qualificar entidades privadas, sem fins lucrativos, para firmar futuros Contratos de Gestão que permitam a essas organizações assumirem o controle de Unidades de Saúde no município. A justificativa oficial é a “melhoria da eficiência”, mas o histórico das OS em todo o Brasil aponta para um cenário de escândalos, desvio de recursos, falta de fiscalização e precarização dos serviços públicos.
HGP: O retrato da falência da terceirização
A situação do HGP, administrado atualmente por uma OS, é um alerta vivo das falhas desse modelo. São frequentes os relatos de:
- Pacientes esperando mais de 7 dias por atendimento médico em casos considerados urgentes;
- Situações de abandono de pacientes em corredores e salas improvisadas;
- Escassez de medicamentos e materiais básicos;
- Falta de transparência nos contratos e nas folhas de pagamento dos funcionários terceirizados.
Denúncias só têm ganhado atenção quando a imprensa local expõe os casos, forçando a gestão a buscar recursos de fora, enquanto lava as mãos da sua responsabilidade constitucional sobre a saúde pública.
O que está em jogo
A qualificação de OSs permite que essas entidades passem a gerir hospitais, UBSs, laboratórios e demais serviços do SUS. Isso inclui contratação de pessoal, compras de insumos, controle de fluxos e decisões administrativas.
Na prática, a gestão do SUS passa a ser feita por uma empresa privada com pouca ou nenhuma participação social. O controle do Tribunal de Contas e da Câmara Municipal se torna mais difícil, e a população, especialmente a mais pobre, fica à mercê de entidades com interesses próprios e gestão opaca.
Cronograma Aponta Rapidez Incomum
As entidades interessadas devem apresentar requerimento e documentação entre os dias 29 de julho e 1º de agosto de 2025. Em seguida, haverá análise técnica da Comissão Permanente de Licitação (CPL) e avaliação da Semsa. O resultado provisório será divulgado no dia 25 de agosto, com prazo para recursos até 1º de setembro. Já a decisão final e o decreto de qualificação estão previstos para 9 de setembro de 2025.. Em poucos dias úteis, será realizada análise de documentos, visitas técnicas e decisões sobre habilitações. Uma velocidade que, em processos dessa natureza, pode abrir brechas para direcionamentos e favorecimentos.
Impacto no SUS de Parauapebas
A entrada das OSs pode implicar em:
- Fechamento de postos de saúde ou sua entrega a entidades sem histórico na cidade;
- Demissões de servidores públicos e substituição por contratos precários e terceirizados;
- Redução da transparência na aplicação dos recursos do Fundo Municipal de Saúde;
- Dificuldade de fiscalização por parte do Legislativo e da população, já que as OSs não são obrigadas a seguir as mesmas regras de prestação de contas da administração direta.
- Aumentar o tempo de espera por atendimentos e exames básicos;
- Criar uma cultura de emergência permanente, onde a solução dos problemas depende da comoção pública e não de planejamento.
Edital Abre Brechas Perigosas
O edital exige, entre outros documentos, a apresentação de estatutos, relatórios financeiros e certidões negativas, mas não há exigência de histórico comprovado na gestão da saúde pública no Pará ou na região Norte. Ou seja, entidades de fora, sem raízes locais e sem compromisso com a população de Parauapebas, poderão assumir funções essenciais ao funcionamento do SUS municipal.
Além disso, a “Declaração de Inexistência de Fatos Impeditivos” (Anexo II) e a “Declaração de Acumulação de Cargo Público” (Anexo V) são modelos genéricos que não garantem, por si só, uma real proteção contra conflitos de interesse ou práticas ilícitas.
Falta de Controle Social
Em nenhum ponto o edital menciona a participação de conselhos municipais de saúde no processo de seleção, fiscalização ou acompanhamento das OSs qualificadas. Isso fere diretamente o princípio constitucional da participação popular na gestão do SUS (Art. 198 da Constituição Federal), enfraquecendo o controle social.
O que diz o Ministério Público?
O MPPA e o TCE-PA já emitiram recomendações em outros municípios contra contratações apressadas de OSs, alertando para riscos de corrupção, desvio de finalidade e prejuízo ao interesse público. Em 2023, o próprio Tribunal de Contas da União alertou que “a terceirização desenfreada na saúde tem gerado efeitos colaterais graves e comprometido o SUS”.
Terceirização: Solução ou fuga da responsabilidade?
O modelo de OSs permite que a Prefeitura transfira obrigações fundamentais da administração pública para entidades privadas, muitas vezes sem controle social efetivo e com pouca transparência sobre os gastos.
Ao menor sinal de crise, como ocorre no HGP, a gestão pública acusa as OSs ou silencia, enquanto pacientes agonizam sem atendimento, dependendo da mobilização da mídia e de pressão política para receber socorro.
Conclusão
O edital representa mais um capítulo da fragilização do SUS em Parauapebas, que há anos sofre com problemas crônicos de gestão, escassez de médicos e falta de insumos. Longe de resolver o problema, a entrada de OSs pode institucionalizar a precariedade e abrir caminho para um sistema paralelo, menos transparente e menos acessível à população.
Perguntas que ficam:
- Quais OSs já estão de olho nesse edital?
- Quem serão os beneficiados com esses contratos?
- O povo de Parauapebas terá mais saúde ou mais problemas?
- Se o modelo de OSs já falha no HGP, por que expandi-lo para o restante do SUS em Parauapebas?
É hora da sociedade civil, sindicatos, conselhos de saúde e vereadores se posicionarem. A saúde pública não pode ser tratada como negócio!
Por Canal PBS – Investigação e verdade a serviço da população.