A política de Tucuruí volta a ser palco de uma trama complexa, onde a interpretação de uma decisão judicial se tornou o centro de um embate entre o Judiciário e o Legislativo. No epicentro da crise, o juiz eleitoral da 40ª Zona, Pedro Enrico de Oliveira, nega veementemente ter ordenado a recondução do ex-prefeito cassado Alexandre Siqueira, mas os fatos mostram que a Câmara Municipal, por “vista grossa”, o fez.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) havia confirmado a cassação do prefeito Alexandre Siqueira e de seu vice Jairo Holanda, determinando o afastamento imediato de ambos e a realização de uma nova eleição. No entanto, uma liminar do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu o pleito suplementar.

O juiz foi claro em sua manifestação oficial: “Não determinei a recondução de ninguém. Isso é prerrogativa do Legislativo municipal”.
A Zona Cinzenta da Decisão
Apesar da clareza do juiz, a situação de Tucuruí expõe uma perigosa zona cinzenta na interpretação de decisões judiciais. A liminar do ministro Gilmar Mendes suspendeu a eleição, mas em nenhum momento revogou a cassação ou ordenou a volta do ex-prefeito. Era, na teoria, um vácuo de poder.
A Câmara Municipal, composta em grande parte por vereadores aliados do MDB, assumiu postura passiva — até conivente — diante da reintegração. O silêncio e a ausência de questionamentos configuram uma capitulação institucional diante de um projeto político centralizado no ex-prefeito. Sem debate, sem transparência — o Legislativo parece cedido às vontades do Executivo, enfraquecendo o sistema de freios e contrapesos.
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Imparcialidade em xeque
Juristas criticam a atuação da Câmara como passo para além do administrativo legítimo: trata-se de uma manobra política para restaurar no poder quem foi cassado por abuso de poder econômico e compra de votos. O juiz eleitoral, ao se isentar de qualquer ação e classificar o ofício como mera comunicação administrativa, não escapa da percepção de conluio político, principalmente quando a Câmara age sem contestar, tornando-se instrumento de retrocesso democrático.
A população de Tucuruí, que já viveu o desgaste de uma eleição anulada, agora assiste a um espetáculo onde a política parece driblar a Justiça. A declaração do juiz desmistifica a versão oficial dos vereadores e coloca em xeque a autonomia e a transparência do poder Legislativo local. O episódio reforça a percepção de que, em Tucuruí, o jogo do poder muitas vezes se sobrepõe à lei.
A falta de fiscalização e de um posicionamento firme da Câmara Municipal perante a decisão do STF demonstrou uma clara preferência pelo retorno do status quo, em vez de defender o interesse público. A omissão dos vereadores, neste caso, pode ser interpretada como um ato político tão grave quanto a própria cassação que originou a crise.
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O que está em jogo
- Credibilidade institucional: casos como este alimentam desconfianças sobre interferência política mascarada de formalidade legal.
- Separação de poderes: a Justiça Electoral cumpriu seu papel ao comunicar a liminar; mas cabe ao Legislativo decidir. O que falta esclarecer é se houve pressão indevida.
O retorno de Alexandre Siqueira ao poder, embora amparado em uma decisão judicial liminar, expõe uma fragilidade institucional grave: o Legislativo local se mostra acovardado ou comprometido, ao invés de atuar como guardião da democracia. A ausência de debate público e jurídico entre os vereadores revela o quanto Tucuruí vive uma crise de governabilidade, onde legalidades tangenciais se sobrepõem à ética democrática.
A pergunta que fica é: a Câmara Municipal de Tucuruí seguirá de “vista grossa” para os interesses de poucos ou assumirá sua responsabilidade de garantir o cumprimento da lei e defender a vontade popular?
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