A partir de 7 de janeiro de 2026, os serviços de água e esgoto de Parauapebas passarão para a iniciativa privada, sob gestão da Aegea Saneamento, conforme confirmado pelo SAAEP. A transição, parte da concessão do Bloco D do saneamento paraense, é vendida como uma solução para “profissionalização” e “investimentos”, mas levanta sérios questionamentos sobre seus reais impactos, especialmente para a população de menor renda.
Mas nem tudo que reluz é melhoria. A concessão, que promete “profissionalização” e “investimentos”, esconde riscos graves para quem mais depende desse serviço: a população mais vulnerável.
A concessão, aprovada sem um debate público efetivo, tem sido criticada por organizações como o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) pela falta de participação comunitária. A ausência de um processo de escuta popular levanta o alerta de que o contrato foi imposto de “cima para baixo”, minando sua legitimidade e abrindo caminho para decisões unilaterais, como reajustes de tarifas e interrupções de serviço sem oposição organizada.
Tarifas e Investimentos: Um Cenário de Incerteza
A preocupação com o aumento de tarifas não é infundada. A Aegea já enfrenta denúncias em outros estados por reajustes significativos e falhas na prestação de serviços em áreas periféricas. Embora a promessa seja de usar uma tabela similar à da COSANPA, a vaga cláusula de “não previsão de tarifação adicional para poços artesianos” não garante proteção a quem mais precisa. Para muitas famílias, qualquer aumento pode comprometer o orçamento e dificultar o acesso a um serviço essencial.
Além disso, a concessão parece ignorar os investimentos já realizados pelo próprio município. Parauapebas aplicou recursos próprios para expandir redes e melhorar a gestão, um esforço que agora será “entregue de graça” à empresa privada. Isso transforma um patrimônio público, construído com dinheiro do cidadão, em uma fonte de lucro para a Aegea.
Controle Público Fragilizado e Promessas de Longo Prazo
A transição também levanta dúvidas sobre a fiscalização. A cooperação exigida dos servidores do SAAEP, que deverão repassar dados e informações, pode levar à “dissolução” da supervisão pública dentro da própria empresa privada. Embora uma comissão da Câmara tenha sido criada para fiscalizar o processo, a efetividade dessa medida depende de seu real poder de ação e acesso a documentos, para que não se torne apenas um “espetáculo político”.
O contrato se baseia em promessas de universalização de água até 2033 e esgoto até 2039. No entanto, o problema reside na dependência de projeções de longo prazo para justificar medidas impopulares no curto prazo, como cortes de serviço e aumentos de tarifa antes que a cobertura total seja alcançada. Sem mecanismos de controle social robustos, a prioridade para o lucro pode facilmente se sobrepor à qualidade e à cobertura do serviço.
Enquanto o SAAEP reconhece que não há impedimento judicial para a transição, a população e as autoridades locais devem estar atentas. A fiscalização da comissão da Câmara, a robustez das cláusulas de tarifa social e a exigência de penalidades severas em caso de falhas na expansão e na qualidade do serviço serão cruciais para mitigar o que parece ser um cenário de risco elevado para a população mais vulnerável de Parauapebas.
Como a população pode se proteger e fiscalizar?
Apesar da transição estar em curso, a população não deve ficar passiva. A fiscalização e a participação ativa são as melhores ferramentas para garantir que a concessão não se torne um prejuízo social.
• Fiscalize a fatura: Monitore a sua conta de água. Fique atento a reajustes, taxas adicionais ou cobranças inesperadas. Em caso de dúvida, procure o Procon.
• Participe da fiscalização: A Câmara Municipal de Parauapebas criou uma comissão para monitorar a transição. Exija que os vereadores tornem os relatórios públicos e que a comissão tenha autonomia para agir, não sendo apenas um ato simbólico.
• Denuncie falhas: Se a qualidade da água cair, o serviço for interrompido com frequência ou a rede não for expandida para a sua região, documente e denuncie. Registre reclamações nos canais de atendimento da empresa, nos órgãos de defesa do consumidor e na própria Câmara.
• Mantenha-se informado: Procure informações sobre o contrato de concessão, as cláusulas sobre tarifas sociais e as metas de investimento. O conhecimento é a principal arma para a defesa dos direitos do consumidor.
Riscos à Vista: O Cidadão Pode Pagar a Conta
A concessão, aprovada sem um amplo debate público, traz preocupações que afetam diretamente o bolso e a qualidade de vida.
• Aumento de tarifas: A Aegea tem histórico de reajustes em outras cidades. Embora a tarifa inicial possa seguir a tabela da COSANPA, não há garantia de que não haverá aumentos futuros em nome da “universalização” ou de “custos operacionais”. A preocupação é que o custo do serviço se torne impagável para as famílias de baixa renda.
• Serviço social em risco: O SAAEP operava com mecanismos de atendimento social. A transição para uma empresa privada, cujo principal objetivo é o lucro, levanta o alerta sobre como serão mantidas e automatizadas as tarifas sociais e o tratamento de casos de vulnerabilidade financeira.
• Patrimônio municipal em mãos privadas: A Prefeitura de Parauapebas investiu recursos públicos para expandir a rede de água. Agora, esse patrimônio será utilizado pela Aegea para gerar lucro, sem uma compensação clara para o município ou a população.
A entrada da Aegea representa um novo modelo de gestão do saneamento em Parauapebas. Para a população, a mudança significa a necessidade de um olhar mais atento e uma participação mais ativa para garantir que as promessas de melhoria não se percam em um cenário de busca por lucro, em detrimento dos direitos básicos.