Em boa parte dos municípios brasileiros, a corrupção deixou de ser um escândalo pontual para se tornar um sistema organizado, contínuo e protegido por aparatos de legalidade. Um dos mecanismos mais usados por gestores públicos para desviar dinheiro público é a contratação de empresas de engenharia sob fachada legal, mas operando com vícios graves, superfaturamento descarado e aditivos contratuais sucessivos.
O padrão se repete em diversos cantos do país: empresas em nome de “laranjas”, sem experiência ou vínculo técnico com a construção civil, vencem licitações milionárias. Por trás delas, escondem-se políticos locais, secretários ou empresários diretamente ligados ao núcleo do poder municipal. Esses contratos, muitas vezes iniciados com valores modestos, multiplicam de forma explosiva com aditivos sem justificativa técnica plausível, transformando-se em verdadeiras minas de ouro para os envolvidos.
A desculpa da emergência, a ausência de fiscalização efetiva e a maquiagem jurídica dos processos criam uma fachada de legalidade. Mas, na prática, trata-se de um roubo planejado, executado por quem deveria defender o interesse público. O dinheiro que deveria garantir saúde, educação, segurança e mobilidade vira financiamento de campanhas eleitorais, compra de veículos de luxo e expansão patrimonial de agentes públicos.
Esse modelo é autofágico e destrutivo. O município perde sua capacidade de investir de verdade, enquanto a população paga a conta com escolas precárias, postos de saúde desabastecidos e ruas esburacadas. É um sistema perverso onde o interesse coletivo é sistematicamente sabotado para alimentar o projeto de poder de uma minoria criminosa.
Mais grave ainda é o silêncio institucional. Muitos vereadores, responsáveis por fiscalizar, se calam — e, em alguns casos, participam do esquema. O que vemos é uma normalização da corrupção, onde denúncias documentadas são ignoradas e quem ousa expor os fatos é ridicularizado como “oposição”, mesmo munido de provas incontestáveis.
É hora de romper esse ciclo. O Ministério Público, os Tribunais de Contas e a sociedade civil precisam agir com firmeza. A omissão, nesse contexto, não é apenas covardia: é cumplicidade.
Roubo com papel timbrado continua sendo roubo. E quem lucra com a pobreza do povo não pode seguir impune.
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